terça-feira, agosto 3

Seu sim

Rude
Mesmo quando diz sim
Não pelo o que há de liberto
Em simplório gesto
Vê-se pequeno
Menor que os insetos
Que sugam suas coxas
E logo rumam pra outra

Seu sim
Espécie de alforria
Brancos libertos
A dizer:
Quase morro
Quando subo o morro

Sim
Som que espalha-se
Por entre as cortinas
Revistas antigas
Canteiros, cantigas

Sim
Prossiga
Em caso de dúvida
Liga
Jamais siga tendências
Elas tendem a desabrochar
Nenhum modo nem moda
Siga atentamente
Bobagem se preocupar
Com o jeito de caminhar

Tragos e conhaques
Esqueça os desastres
Lembre de sonhar
Não cure a ferida
Vil também vívida
Dói dos ralos cabelos
Até o vão calcanhar

Sim
Para travestis e putas
Vagantes, bruxas
E bruxos
Cortiços, luxos
Cantina, bar
Sim
Para o esfarrapado
E o burocrata
Sim sem ensaios
Sem jogadas
Sim

Ah sim...
Pra não negar
O osso
O esgoto
O desgosto
O cachorro
Sem molho
Ou com molho
Pronto pra salgar
O dente doído
Elo corrompido
O pai, o marido
O vão do umbigo
A centralizar
O que há de ser
O que há de sarar
Num tempo quando
Onde, ontem
Amanhecerá.

segunda-feira, julho 12

O frio e a frigidez

Insone, busco a palavra que apraz o desassossego, a agonia impetuosa, a ardorosa fuga sobre o apego, a ventura inacabada, o destino em reles trapos, desatino que impera a madrugada que observo pela janela, passantes esquivos, estranhos, malditos, caminhantes que se esmeram abstraindo o frio e a frigidez, eu cá elucido alguns fardos, o desamor cru e palpável, esvaziando a cama, esvaecendo os faros, o aroma do café e do cigarro, e o corpo emaranhado de desaventuras, fragilizado e entregue às assolações presentes, cada distorção, e raspo brevemente o insolente e despudorado espasmo de verdades incontidas, jamais ditas, expressas em dubiedades que inundam lençóis e tapetes, releio poemas, bulas de remédios, bilhetes, acaricio sutilmente cada densa linha, e costuro aos descompassos dez compassos abstratos, minimalistas, incomuns, num papel antes amassado, liberto de entendimentos, previamente desprezado, todo ele reticente, ...................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................... o sentido é o que habita nas vagas idéias, que nada dizem, não afagam, não imprimem, sequer existem, nenhuma trama ou qualquer moldura de frases meticulosas, isto não vale coisa alguma, isto é, o que restou de nós.

terça-feira, junho 22

Nu

Quando chegar, tire em imediato suas roupas, eu quero ver-te nu, exposto, imposto aos meus devaneios, quero apalpar a rispidez e a lisura, anseio o foco sobre o teu pênis ainda amanhecido, te espero trêmula, esmero uma canção antiga, um verso de outrora que dilacere cada enfermidade, a deformar os sentidos, transfigurar as sutilezas, quero ver-te nu, como havia dito, e apalpar cada emaranhado de pêlos e cruas carnes, mornas, cálidas, austeras, almejo ampliar o foco, eternizar em polaróides o lúbrico cerne do corpo que me penetra, em una moradia substancial e lasciva, a língua, a saliva, a porra, a face inebriada e ardorosa, não conte-me sobre os fatos, não diga-me segredos, anule as urgentes notícias, pode me chamar de puta, desvairada, insana e torpe, o porre que compartilhamos, a falta sórdida que agora esvai-se, goze sobre os meus lábios, minhas ancas, meios seios, arruíne esta distancia, aproxime-se faminto e sujo, me coma, alimente-se do meu liberto sexo, e já saciado implore por lamber meus pés, saliente e impuro, a deflorar as horas, dias, meses, e imperar o alicerce que nos une num baque de tempestades, intensos brios, vorazes ímpetos, quero beber o teu suor pra sentir sede de você.

segunda-feira, junho 7

O lábio e o labirinto

As feridas expostas, remotas e frígidas, assopro com sutileza, e a cada ardor mais espesso, rememoro o cálido olhar, pra me enxergar de um outro foco, e testemunhar uma felicidade distante, distinta, como os teus pés nos meus num qualquer dia, entre edredons e cafés, e um revés de emoções, a acarretar um conglomerado de sentidos vãos, mal sinto, já não reconheço o amor, esvai-se entre remotos espasmos e o calendário que teima em perpassar os dias, a barba por fazer a emaranhar a minha frágil face, o lábio e o labirinto, o afago de deus e do diabo, os passos que rumam rente ao mapa em branco, páginas que esmero com o despudor e a rispidez que me cabe, onde me coube as carícias, as malícias de terça, os cigarros acesos, a esperar um esmero presságio, vago, vário, vagante e mundano, como as paixões repentinas, alusões, ilusões postas à prova, castelos de areia arruinados por uma brusca tempestade de verão, restou-me os poemas esquivos, a bermuda rota, as sandálias de couro e a sua bússola disforme, que aponta um brado, um diálogo, uma dúvida, tomo aspirinas com pura vodka, não quero querer, e anseio, não mais seus pigarros, seu catarro, seu chulé, a densidade imposta em que se finda o concreto sentimento, cimento e tijolo, o lobo mau dispensará seus murros, protejo-me das adversidades, dos encontros inesperados no jornaleiro, do telefonema madrugal desdizendo conjuras, e um amontoado de quinquilharias que apertam meu peito, a fotografia na cortiça, o bilhete hermético, o orgasmo lascivo, represento, aumento o tom, minto banalidades, desfaço perguntas, invento uma alegria estática, pra não imperar tristes fatos, cinzentas entrelinhas, fardos que não compartilho, hei de herdar o peso incomum, a parca lisura, o reles impacto, "e ninguém aqui vai notar que eu jamais serei a mesma".

quinta-feira, maio 6

Um riso

Estes rabiscos publicáveis, em páginas de jornal classe média, com ar supremo de quem visitou a esmo - ensaiando versos - todos os pontos mais out desta cidade empolvorosa, e todos chamam teu nome, você acena amélie, como quem eterniza um instante em fotografia polaroid, toda ela, logo some, dilui-se...criança.E criam momentos de extrema sensíbilidade, lhe deixam flores e minúcias, e vão-se. E vão-se soa...soa-me vago, existe e parte-se, um café morno com bolachas de morango. Será mesmo a cisma? Acho que não gosto de você. Assim como concordo com teus pés nos meus pés, em dias assim, em busca da proa. E se você me ouvisse, se por a caso, quem sabe ontem, você me disse "eu não lhe guardo meu rancor, querido", e mais ainda, ainda que por mais que insista, nada me valha, e vale a pena escrever quando não sinto a linha, costuras disformes, visto você de asneiras, dissimulações, conhaques e tecidos rotos, porque...porque posso, amélie. Te invento, transformo, informo e pronto, eles acreditam. E então me levanto -assim-rápido-sem pausas-sem-pensar - ajeito os cabelos, acendo um cigarro, esqueço-te no cinzeiro, e canto joão neste seu impróprio violão de aço. O sol na cortina verde-musgo, não gostei e pronto. Você não sabe de cores, não tá na moda verde-musgo, não tá na moda bancar ser além, germinar sementes semânticas, e também não vi, em todas as bundas que vislumbro mensalmente na playboy, qualquer versinho seu que me soe realmente seu. Entende? então Foda-se. Hoje eu não acordei para escrever metáforas, e consertar palavras, e ajeitar parágrafos. Na verdade, mal reli qualquer entrega, e se você for ler, por favor, chore. Já não tenho tempo, ainda resta um trago ou dois no cigarro esquecido em meu cinzeiro, e se por ventura decidir partir, de repente, para sempre, não esqueça de levar as chaves, novamente.

Um riso,
C.