terça-feira, dezembro 25

Rio, Dezembro.Qualquer dia, qualquer hora.

Parece outubro, e os dias vão aos poucos desfazendo-se em meus desalinhos, uso um moletom vermelho pra ver se impero uma nuance a mais no ambiente, e fico rindo bobo-bobo destas minhas aventuras. Seu disco da Rosa Passos toca incessantemente aqui em casa, "jurei te pertencer por toda a vida, guardar a sete chaves o nosso amor, a chave era só uma e foi perdida...", e eu me recordo das palavras todas, entre uma canção e outra escuto atento o silêncio voraz pra ver se entre as minúcias mais ínfimas ainda restam ressonâncias da sua voz em mim, bobagem não é? Mas é que te quero tanto bem, e fico vislumbrando fatos, revendo fotos, relendo cartas, corrigindo versos mais densos por outros mais lineares, é um contato pleno que me acaricia levemente, e eu me deixo ir sem rumo neste caminho que não é caminho, neste caminho que é somente vão. Quero saber se está dormindo bem, se tem alimentado a Poly, se comprou um quadro novo, fico pensando nos horários e nas viagens e quase esqueço-me da água que esquentei para o meu chá, penso que chá com biscoitos é o que há de mais reluzente no que diz respeito a solidão, e eu ando tão sozinho, confesso. Nem telefonemas, nem ombro de amigos, nem. Somos maduros demais para pedir a mão alheia, e no final das contas todo mundo tem de pensar no aluguel e no preço da gasolina, então me calo e vou levando sem sentido as minhas reentrâncias, vendo uns filmes que deixara pra depois, relendo Clarice, chorando e sorrindo em espasmos de tempestades, gosto do barulho d’água e da claridade dos trovões, me absurdo com a força que isto impõe, olho ressabido pelas frestas, tenho ganhado tempo com estas pequenezas, e já fico me indagando se ‘ganhado’ é correto ou proibido numa carta escrita assim a esmo, para você ler desatenta enquanto pinta as unhas (risos), decido deixar como veio, não quero emoldurar de beleza rara um desabafo cinza e prometo não me estender muito, escrevo só pra dizer que ainda estou aqui, na Rua Santo Assis nº 08, o quarto está uma bagunça, tem roupas por todos os cantos e uma toalha de rosto enfeita cinicamente a cabeceira, uns copos perdidos, uns livros abertos pela cama, tenho lido trechos desconexos, formulando histórias naquelas imagens opacas que surgem em trechos sorvidos livremente, ah, também cortei os cabelos, e não faço a barba faz uns três dias, por pura preguiça mesmo, comprei novas sandálias de borracha, me senti perdidíssimo tendo que fazer sozinho as compras do mês, acredita que eu não fazia a menor idéia da marca do feijão que usávamos aqui em casa? Pedi ajuda a uma senhorinha e acatei o seu conselho, mas nem liguei o fogo ainda, só sei fazer café e chá, ontem comi cachorro-quente, sujei minha blusa inteira, hoje pode ser que eu saia para caminhar na praia, gosto de olhar atentamente o mar e perder-me em sua infinitude encantada, na volta talvez ligue a tv, e fique alternando os canais enquanto articulo idéias rasas até pegar no sono. Ficou um tanto grande a carta, e meio chata também não é? Desabafos são sempre ocos. Não sei se lhe envio por e-mail ou se imprimo e mando selar, acho que deve ser mais valioso ler algo em mãos, sentir a matéria viva, os sentidos pulsando. No fundo eu nem sei bem se devo te enviar, sei lá...to achando tudo isso tão ruim, e meio triste também mas não quero deste modo, to numa boa, juro, tenho descoberto peculiaridades preciosíssimas em mim, ontem mesmo me descobri um ótimo regador de plantas, agora rego as plantas pela manhã e leio o jornal bocejando sem você pra rir de minhas fisionomias, o caderno da tv fica esquecido pela mesa, parece sentir falta dos seus murmúrios sobre o novo namorado da fulana, olho pra ele e quase leio as notas moriBundas, mas me resumo à economia que já é por demais complexa e vasta. Já escrevi pra caralho, eu sei, mas é que tenho estado tanto em silêncio que quando falo/escrevo sinto esta urgência de enumerar todos os fatos, um por um. O disco da Rosa ainda toca ao fundo e eu vou ficando por aqui, preciso de um banho quente e de um vinho branco, mas por hoje só me resta o chá mate e as bolachas recheadas.

Te deixo um sorriso claro e o meu amor confuso.
Seu âmago,
C.

sábado, dezembro 22

Frestas

parece que as aves se absurdam de azul
e então voam
azul flutua, creia
se absurde de azul.


fromhoej era um menino calado
e mal-visto pelos seus comportamentos
ele dava a andar de retalhos
e fumava na praia com Lino
que era um menino bem visto pelos seus comportamentos
mesmo fumando na praia e andando aos retalhos
fromhoej achava graça e sorria breus
Lino sonhava acordado desenhando versos na areia com seus brancos pés-de-vento.

se a sina for turva
desfaça o verso
nem tente um soneto
não sonhe, não vinga
promessa de lira nula
diga a ela que não há poesia
e que você tirou férias e foi pro Caribe.


sabe de uma coisa?
sabe.

quinta-feira, dezembro 20

aquarela nefasta

quadro a quadro um ponto
ponho-me em frente ao distinto traço
caminho adiante, aprimoro as feições
reverbero os caminhos pintados de sonho
irreal é a vida que vivo aos retalhos de ócio
pensamento nefasto
inunda o ônibus lotado de destemperanças
esperanças à espera de um afago breve
mas não há nada além da rota rôta, pura de cinzas
dias que findam e emergem
como todos os dias que findam e emergem
nenhuma nova cor nos olhos dela
nenhum verso perdido nas paredes sujas
pensamentos relapsos, argumento inaudível
chego ao ponto e me lanço ao caminho de casa
um banho quente, um café morno...
nenhum adorno emoldura os quadros da sala
nenhum adorno emoldura os quadros da sala
nenhum adorno emoldura os quadros da sala
insone me vingo dormindo-acordado
a real ressonância que a vã vida...cala.

domingo, dezembro 16

Mar de mim

olhos verdes cor do mar de mim
que azula-se nas manhãs rente as auroras
e transformam aquarelas na infinitude
de águas que - encantadas -
bailam ondas sutilmente

seu vestido bege tinge as tardes
que alaranjadas ganham tons de prata-
madrugada
seus passos lépidos pincelam versos-brisas
nas areias entorpecidas de Ipanema

na imensidão de mim há espaço pro amor que é seu
na quietude daqui ressoa a sombra de nós


andar pela areia estrada de carmim
que rubra a mente traz a lua que implora
seus olhos a cruzar o espaço rumo a noite
em que teremos mariposas na janela
bailando cores em música negra

sua boca espalha vinho na alameda
onde flores brincam de ser criança-estrela
acende os versos que te desenham em mim
um pleno céu de breus e multi-tons
nas pedras entretidas do Farol

na imensidão de mim há espaço pro amor que é seu
na quietude daqui ressoa a sombra de nós



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Mergulho em parceria com o poeta azul e amigo querido Alexandre Beanes

domingo, novembro 25

Telefonema

- Alô...
- Sou eu...

(naquele Eu reconheceu todas as suas dúvidas, seus descompassos, tantos tropeços. enxergou com minúcia cada palavra não-dita, no torpe silêncio que precede algum desfecho, algum caminho. ressonância atordoante, feito trovoadas, naquele baque monumental, intenso, voraz. foi neste Eu que um dia perdeu-se inteira, e se entregou num labirinto de pernas, nucas, peitos, braços, lábios, e numa noite dessas lacrimejou lembranças, entristeceu todos os porta-retratos, emoldurou canções de amores findos, recolheu cada aroma que restara, qualquer rastro sutil, algum bilhete, uma blusa esquecida, algum pequeno presságio, neste Eu que um dia fora ela em tantas formas, em muitas forças, entrega plena que desfaz-se bruscamente, sem restar tempo algum para compreensões, entendimentos, indagações, ferida ainda aberta que incessantemente pulsa, lembrando, segundo a segundo, o estrago devastador de uma rude tempestade, já não há casa, já não há folhas, versos, já não há risos, não há cortiça, nem planos, nem quartos, as portas já não batem, as chaves se perderam, todas as chaves, trancando em si também todos os vãos sentidos.)

- Ah, oi...pode falar...
- Desculpe estar ligando essa hora, é que eu esqueci de buscar os meus sapatos de festa e estou necessitado deles, você pode deixar na portaria?Passo aí daqui a pouco pra pegá-los!

quinta-feira, novembro 15

Prece

Para Lolló , e para Você e os seus olhos de mar

vislumbres de um novo céu, talvez um pouco menos denso, coisas do verão que chega arrebatando corpos, tempestuoso, monumental, clareando os pensamentos que vagavam moribundos, dando espaço pro azul romper barreiras, celestial azul a encantar olhares, alaranjando as tardes frescas, algumas brisas teimam em bailar rente aos olhos, folhas que voam lépidas, pétalas lúdicas feito o som de um piano, pétalas e piano, flor que supõe-se música, música de se olhar, olhos que se cantam melodias, ouvidas pelo peito ofegante de amor, é tanto sentir que impera no tempo que o azul ganha novas nuances, o crepúsculo nos traz aquarelas, eu vejo os pincéis e as pinturas, e o seu rosto e as pinturas, e a sua boca e as pinturas, e as suas sardas nas costas e todas as ondas lá embaixo – quando eu lhe dizia suavidades neste meu canto de olhar que não é mudez – e em si tudo é música, quando os olhos se escutam e entendem-se dentro, quando um olhar mora dentro um do outro, moradia cálida, sutilezas em focos de lumes que se entrelaçam, iluminando-se e junto clareando os caminhos, quando o amor torna-se além e contagia a natureza com a sua claridade...já tentou pintar o rosto do mar?e dizer o ruído das folhas?e apalpar o sentido de um vento? caminhos emoldurados de encantos, nossos passos desenhando versos, rastros que deixam poesia no percurso rente às águas, um rumo de sutis belezas pincelando sonhos, tão nossos, tão livres, e a minha prece pra que você fique, até não saber mais partir sem mim...

quinta-feira, novembro 1

mergulho de cabeças

Para Lila

porque há decisões
e porque posso escolher
a cor do fundo do poço
verde-limão talvez lilás
vermelho, não
azul-marinho

e hei de acertar os pontos
marcar o X corretamente
há de se ter muita cautela
com poços e cores e fundos
sobretudo

mergulho receoso
claro
plena escuridão de cinza
o poço é cinza, tijolo e cimento
e a cor são idéias e o fundo sou eu
azul-marinho em águas de reservatórios

e posso vislumbrar nuances
a cor do fundo
do poço
e ir
a pé
a pá
que cava a terra
que abre as fendas
que corroe breus
a luz que entra logo dispersa
e volta o breu do fundo sem fundo
e sem cor
sou eu o fundo
sem fundo e sem cor
já não há poço
nem água
nem alma
nem dor
só há vermelho e vermelho e vermelho
e vermelho

lágrimas sutis são poças enfadonhas
quase ninguém percebe que elas me inundam
e matam
poços que se fundem dentro e jorram
borrando a maquiagem da garota pálida
agora nua e vulnerável
verde-limão talvez lilás
vermelho, não
azul-marinho.

sexta-feira, outubro 26

a partir da partida

é desconcertante rever-me
e não ver-me aos meus passos
as minhas falas meus gestos
meus olhares sem foco

angustiante me olhar
e olhar outro ser
sem ser eu sem ser quem
nunca vi nem nem sei
quem se foi
quem se fui
um adeus que alivia
dor que dói já não sendo

demasiado tato falta ar
o ar sufoca-me
já não sou ao seu lado
já não sei quem tu és...
nunca soube o seu nome
não saber impulsiona-me
a partir da partida
sem início sem enredo
onze horas onze e um
conto o tempo e tão somente
só mente...
finda
finda

desintegro-me a noite
breu de palidez
amanhecido
sem boêmia sem poesia
busquei querer ser plácido
fuga repentina da profundidade inacabada
não houve busca não houve entrega
entoei ressabido um "de nada" abafado
só silêncio e frio e indigestas ressonâncias...

quinta-feira, outubro 18

Guardanapo

Quiçá uma piscina de versos, nado em palavras, mergulho límpido...
Mas é que às vezes os pântanos me encantam de medo e de breu, alguém me disse - talvez eu mesmo - que alguns tesouros só reluzem no breu pleno, eu apaguei a luz e escutei Madeleine sussurrando "Diz-se que além dos mares / Ali, sob o céu claro / Existe uma cidade / A estada é encantada /E sob as grandes árvores escuras / A cada noite /Pra lá se vão todas as minhas esperanças...", foi então que eu descobri que o meu breu também pode ser azul, quando eu assim desejar.


Mergulhe.



Beijos,
um blues e um dry martini...
Eu sou aquele, lá dentro.

terça-feira, outubro 9

Caminhador

Habito, sobretudo, em papéis.Às vezes, de súbito, desprendo-me de folhas e vagueio por aí, descompassado, escrevendo em postes, em luzes, em carros com seus autofalantes, nas calçadas sujas, na mulher rude fumando o seu Marlboro, no cão que late ao léu, sem dono; no silêncio, no escuro da noite, na cintilância dos breus.Escrevo em ruas, escrevo em passos.Caminha dor...
Mas logo volto aos papéis, desarrumados, repletos de auroras, e por ali adormeço, inteiro e lépido. É que sempre vivi amor em palavras, me apaixonei por versos, por metáforas, citações, poesias.
É que sempre lidei melhor com palavras, com a naturalidade de quem molda um artefato pleno, cristalino, minucioso; quanto aos humanos, encontram-se normais em demasia - buscando água salgada em cachoeiras, almejando outros planetas, quiçá todo o universo e esquecendo, por completo, que há um mundo, cá dentro, esquecido, ainda não desbravado em sua verdadeira infinitude e importância - , tornam-se, portanto, tão mais complexos, tão mais difusos, tão mais distantes do que há de próximo em cada Ser, estar Sendo, Viver...
Eu sou dentro.

quinta-feira, outubro 4

Beleza triste

Você me disse que possuo uma beleza triste
e se sorrio há nuances de amargura em meus lábios
você beijou a minha boca rente às lágrimas
e provou o doce mais sublime gota a gota

E ainda disse que meus olhos são nostálgicos
e que há vislumbres de um céu cinza em meu azul
logo em seguida falou da cor de minha blusa
mas eu só uso preto...

Se eu fosse você enxergava a tristeza que carrega
se eu fosse você percebia o quanto seus olhos são densos
se eu fosse você despia-me destas pétreas armaduras
se eu fosse você compreenderia que somos os mesmos
que no fundo ainda sonham auroras e minúcias vãs...

A gente pode ser feliz da maneira que nos cabe
e nós podemos ser livres
e nós podemos ser leves
só me leve pra olhar o mar revolto
só me leve pra olhar o mar revolto
só me leve pra olhar o meu céu cinza
bem dentro dos seus olhos densos...

quarta-feira, setembro 26

603B

eu fito o seu olhar e digo
melhor
eu fito o meu olhar e digo
assim
eu fito o seu olhar no meu e digo
também
fitando meu olhar no seu dizendo:
..............................................................................................
e jaz uma declaração mútua de amor.

- amanhã às 17 hs passo em seu apartamento.

sexta-feira, setembro 21

abstrações

desmorona-me
agora some
dissipa o verso
a poesia viva
finda
agora vá...
jamais verá
jamais verão
nada palpável
abstração
tudo mentira
mentira
tira
quiçá delírios
tudo ilusão
antes de ir
desligue a luz
e mude o tom
nenhum bilhete
nenhuma nota
no violão
vá,
bata a porta
silêncio pleno
adeus,
paixão...
vou esquecer-te
vou esquecer-me
um dry martini
talvez drummond
até dormir sem sono
sem sonho
rente à luz opaca
da televisão...


na noite infame
os gatos miam
ao léu sem dono
na noite infame
te chamo te clamo
ao léu sem dono
na noite infame os gatos miam
só miam,
porque não sabem dizer te amo



(mas sou eterno
e você tão moço
clara diferença
eu sou poema
você...esboço)








terça-feira, setembro 18

...

Para Paula Berbert,
(quase) sob encomenda.


Cheguei quase lá mas fui ao menos
e disse mais ou menos que te quero
da próxima vez te falo sem receios
sobre o mar o amar o amargo
e o amarelo
Porque ninguém entende a minha forma de dizer te quero
porque ninguém entende a minha forma de dizer
porque ninguém entende a minha forma
porque ninguém entende
porque ninguém
por que?

quinta-feira, agosto 23

para sempre, de repente

ainda bem que você foi embora sem nem ao menos me dizer "vou indo...", livrou-me da cena patética de te ver voltando dizendo que esqueceu as chaves.
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nas variações de lógica, um dia pensei ser sublime quando no fundo era somente vão, no mal-amar dos bons-amores todos os sentidos carregam consigo tantas possibilidades...

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já não me interessa as suas indagações sobre o tempo e a rapidez das coisas, tampouco a sua imagem cult-estudei-fora-sou-o-máximo que você teima em insistir bancar.

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na verdade, sinceramente, eu devia estar bem doido quando disse que teamava, o amor tem dessas coisas, todo mundo sabe, todos uns cegos sem receios que rumam o atlântico sem mapa e sem bússola, sorridentes e confiantes, e foi assim também comigo e eu também me perdi, claro.

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a canção de amy ainda ressoa pela casa, os versos densos ainda me dilaceram, gosto da canção e do que ela me traz de nostalgia e presságio - paradoxal e cálida - o volume precisa ser exato, no tilintar dos acordes que adentram em mim sem rodeios, trazendo você pra mais perto. recordo os seus olhos pequeninos, fechados, ouvindo o que há de mais cristalino em cada ressonância, a sua alma entregue àquele timbre escuro, dando a nuance exata do instante de entrega. aos poucos nossos pés encostam-se, displicentemente, e se acariciam rente às melodias-brisas que nos tomam, olhares perdidos que se encontram, mãos que se entrelaçam num tempo de intensidade, como quem toca o corpo querendo tocar a alma.

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você, em seu todo, é uma extensa metáfora, dessas que nos põem em choque, pensando, refletindo, desvendando sentidos, mas você é oco, não há nada de relevante em suas entrelinhas, há vazio apenas, uma burrice bem-articulada de quem leu Neruda para passar num concurso do Estado, e a terrível nostalgia do garoto que queria ganhar o mundo, e hoje mora num apartamento cinzento de uma rua esquisita em Botafogo.

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eu lembro que eu citei Ana Cristina César, assim que nos conhecemos: "Porque essa falta de concentração? Se você me ama, por que não se concentra?", você sorriu um sorriso frouxo, eu entendi como um sorriso de quem já leu tudo na vida e já não se surpreende com tamanha euforia num verso lido a esmo, para assim ficar urdindo com tranqüilidade a poesia que lhe surgiu de repente, mas não, era um sorriso que me falava "o que você está dizendo agora?", e eu ali, tecendo pensamentos tão bons, tão profundos, enquanto você à minha frente vagava em idéias tão rasas, tão equivocadas, tão nulas.

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para onde vão os amores que se cessam?em que lugar eles descansam?qual o caminho que percorrem, será que se perdem e adentram em outros corpos?porque?porque teimamos em vislumbrar eternidades?só para doer ainda mais quando a realidade crua bater à porta? não seria mais simples - e mais inteligente - viver o eterno que habita em cada instante?

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entenderam que o amor terminaria ali, olharam a ponte abissal que os separavam, compreenderam que não havia mais motivo para atravessá-la, que lhes restavam a dor e as sensações que pairavam no tempo, sentiram o amor se esvaindo, e isso é como passar uma faca bem afiada em suas almas já tão desgastadas, as mãos trêmulas, um vazio amargando a boca, o amor virando areia, o amor caminhando com seus próprios pés, tomando cada vez mais distância, até desaparecer por entre as dunas...

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ele não percebeu quando ela se foi, ela não olhou pra trás quando decidiu ir embora; na verdade, ninguém sabe ao certo quem partiu primeiro.

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Termino esta história com o mesmo silêncio que pairou sob a despedida, e antes ainda, sob todo o tempo em que ficamos juntos.Tempo de silêncios, de palavras vazias, de discursos frígidos.Paira por aqui este infindável silêncio, silêncio esse, que deve ter sido o discurso mais romântico, e verdadeiro, que você me ofereceu.

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mas é que a felicidade cabe em cada espaçozinho ínfimo; creia, ultimamente dei pra dormir abraçado com ela...

sexta-feira, agosto 17

Dos bilhetes de Lila - Parte I

das agruras dos dias, seus torpes olhares, de desdém ou vislumbre - nuances apenas -,num instante brilhantes noutro somente cinzas, espasmos de tantos desejos, que já não habitam este espaço, vagueiam descompassados em olhares terceiros, plantas que morrem por excesso d’água, versos reescritos por erros de concordância, mas metáforas não tocam o corpo como eu te toquei, metáforas são só metáforas, distantes, difusas, ambíguas e frágeis - você. “a maldição do poeta seria tocar o mundo por metáforas...” . e assim, sem fim nem início, termino o que de mim não começou num breve impulso, sentimento que em mim pairou por todos os segundos, urdidos de delírios, presságios, silêncios e ardores. no tilintar dos sentires, no mínimo vão de lábios que se desencontram, vozes que cessam sem beijos, amores entendem-se findos, corações se põem à procura de casulos, despetalados, buscando o que um dia flor, tornou-se fardo...

sexta-feira, agosto 10

acordes

Fugindo da normalidade
encontrei a raridade dos sentires
dos prazeres
dos deveres que não devo
das mentiras que não digo (sim, eu minto!)
quando eu falo de tristeza
quando esqueço da beleza
das canções e dos poemas
dos tufões e dos dilemas
(teorias, teoremas...)
Passos meus descompassados
seguros, desenfreados
diários e sem fim...
Qualquer canto é canto, e pronto.
Um acorde meio tonto, dois acordes e são tantos,
acordo no ponto, enfim
no aqui e no além
venho para ser alguém,
mas sem esquecer de mim...


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Poeminha escrito aos 17 anos e encontrado, despretensiosamente, no avesso de um caderno escolar, entre inúmeros rabiscos, gravuras torpes e pequenos corações que continham as letras "C e S" emoldurando o seu interior.

quarta-feira, agosto 8

Me gusta

Eu te gosto, e isso é brisa. Gostar de você e gostar de biscoitos, tão simples. Gostar de sua voz e gostar de Caetano, gostar. Eu gosto. Das suas sobrancelhas. Dos seus badulaques. Do sorriso grande. Dos passos.Da letra. Eu te gosto, e isso é noite. Voltar de carro pela estrada velha. Sentar nas areias de Itacoatiara. Perceber as estrelas mais perto. Mar bravio. Ondas nossas. Gosto. Dos olhos que se encontram. Dos silêncios que se dizem. Melodias em seus dedos. Seus anéis. Violão. Eu te gosto. Suores. Entregas. Dois corpos. Um só corpo. Vodka. Duas. Duas mesmo. Gemidos. Dezenas. Minúcias. Gosto. Gostar de você é frágil. Poema. Multi-cores. Fotografias. Tênis vermelhos. Programa do Jô. Pés que se entrelaçam. Cobertores. Eu te gosto. Do soprar de pérolas. Do sonhar de nuvens. Do frescor de outono. Gostar. Bolo de limão. Meias e chinelos. Café. Domingo de tardezinha. Conversa frouxa. Paixão Segundo GH. Frestas entreabertas. Aretha Franklin. Eu te gosto, e isso é claridade. Enfeites natalinos. Dicionário. Textos de Marla. Esculturas de areia. Morangos. Tempestades. Grama vasta. Piscina. Eu gosto. Cartas antigas. Sinais. Perfumes. Jardins. Flores. Docilidades. Gostar de você é leve. Sua blusa verde. Suas divagações. Suas cifras. Seus cabelos molhados. Sua tv ligada a esmo. Gostar. Seus lábios. Seu caderno de contos. Suas viagens. Seus afagos. Seus enlaces. Vislumbres. Decalques. Sutilezas. Possibilidades.Gosto. Cerejas. Sentidos. Cores. Movimentos.Nuances. Encontro. Liberdade. Gostar de você e gostar de gostar de você, presságios que pairam...en-cantos.
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Eu te gosto, e isso é amplitude...

quarta-feira, julho 25

impulso

inclino o meu corpo em direção a seus olhos, sedentos por uma vodka e um cigarro, reclamando do calor e do trânsito e da vida e da demora de tudo; inclino ainda mais o meu corpo, enquanto articulas sobre as notícias e o trabalho e o aluguel absurdo e o preço da gasolina; inclino o meu corpo em extensa demasia, enquanto comentas o filme em cartaz, o livro que lera, as piruetas do seu cão, a canção da novela; inclino intensamente o meu corpo, você indaga-se a respeito da política, da meteorologia, da gastronomia, da filosofia, dos seus dissabores; inclino plenamente o meu corpo num só impulso em direção a seus olhos, e desabo cruamente no chão.Você percebe-me inteiro, palpável, acessível, vulnerável; retraio com destreza o meu corpo acanhado, para que já não me vejas...

terça-feira, julho 24

sem mapa

onde as brisas serão rosas cálidas
enlaçando-se ao meu desalinho
ventanias submersas no tempo
reluzindo o presságio dos mares

e após o vislumbre das ondas
me dizes que vais me esperar
às 02:15 no antigo cais
direi-te adeus com meus olhos de céu
navegante das águas bravias

no oceano sem mapa em que partes
choverá por todo o gélido inverno
e as águas do céu serão tuas
beberás cada gota de mim

terça-feira, julho 17

Sobre sutilezas e introspecções

Difícil à beça falar de economia Lulística enquanto se esta louco de paixão, com o coração aos descompassos, a boca seca e o celular te olhando com um certo ar de desdém; chego a pensar que ele está com defeito, e desligo e ligo imediatamente o aparelho, para ver se assim ele chama e eu atendo e é você do outro lado convidando pra um pizza, onde falaremos de qualquer assunto, só para estar perto um do outro, poder olhar de perto cada dente mais à mostra, cada minúcia dos lábios, os gestos tão soltos, cabelos despenteados entre chopps e mordidas.Tão bom estar assim, perto, acessível, sem buscas vãs, sem discussões profundas sobre o mundo, só a gente ali naquele bar quase cheio, mas ainda assim só a gente naquele lugar, lembrando de um dia qualquer de um tempo sem importância, enquanto você abre a bolsa e pega um batom e eu o tomo suavemente de suas mãos citando Caymmi, “não pinte esse rosto que eu gosto, que eu gosto, é que é só meu...”, você sorri tão feliz que a essa altura eu já ganhei a noite, e fico extremamente contente só em te ver sorrindo assim pra mim, sem cerimônias, sem receios.Você é livre e isso me encanta tanto, tenho vontade de ficar te olhando por um tempo, só te olhando, percebendo as tais particularidades tão suas, os teus gestos mais afoitos, o seu jeito de olhar para as coisas, e sabe o que eu gosto mais ainda?Quando você suspira pra falar, então articula sem rodeios, e logo em seguida pergunta se falou demais, eu acho tão bonito, você falando e falando e eu, no mais profundo ardor da paixão, me desligando de todos os sons e fitando somente a sua imagem encantada à minha frente, pintura em movimento, e de repente o som cessa de uma só vez e você indaga tão sutilmente se excedeu-se em seus pensamentos; tão linda, tão perto, tão minha, me aproximo e te abraço com todos os suspiros e desejos, me aninhando em seu pescoço como quem tem sede de amor e digo que ‘não’, que é sempre maravilhoso escutá-la, que realmente este filme do Almodóvar é um primor artístico, e logo emendo falando do novo disco do Caetano e você escuta tão atentamente que eu me pergunto se estou falando sozinho, enquanto você adentra em cada sutileza minha, deixo-me levar por todo aquele encanto e continuo articulando pensamentos e citando versos e olhando fixamente em seus olhos e te amando em cada detalhe de seu rosto e te desejando em cada frescor de sua voz e me apaixonando cada vez mais em cada instante ainda mais profundamente e porra...nada do telefone tocar!


- Sabe, Clóvis, li num artigo um pensamento instigante, dizendo que "a condução da política de juros - os maiores do mundo - pelo governo é desastrosa porque dinheiro que deveria ser investido em obras públicas de grande impacto econômico é totalmente drenado ao setor financeiro..."

- Aham...sei...interessante...

segunda-feira, julho 16

a busca

garagens
instantes
estantes
e tratores
estacionam
em direção
ao sentido
em direção
ao sentido sim tido?
ou ao sentido sentido?
será-sarah-serão-sarau-será que chegarão?
senão este poema
será o quê,
então?
sentido sem tido
é apenas sen
garagens
instantes
estantes
e tratores
estacionam
em direção ao
tido.

ao volante da vida
o poeta brinca de palavras-
encruzilhadas.

terça-feira, julho 3

Trilha Sonora pra Juliana

numa poça d'água que restara
de uma tempestade repentina
ela afunda suas meias-beges
para esfriar a cabeça e se esquenta
rumo à Arábia Saudita
porque quer provar sushis exóticos

ganha as horas contando estrelas-do-mar
e dançando Ronnie Von em frente ao espelho
suspeita até não pertecer à este mundo
mas ela morre de medo de Et's e nunca nunca
nunca andou num disco-voador

dirigindo o seu escort verde-uva ela fita a orla de Ipanema
ela escuta rock and roll, ajeita os cabelos, e pensa em mim...

terça-feira, junho 19

Guerra e Paz

acenda a luz enquanto não há noite
para escurecer os nossos versos

desfaça estas palavras já demasiadas
disfarça, é que vem vindo gente
apaga este cigarro e me beije
no escuro dos teus pensamentos

agora clareou, por ora clareou
se soubessem a paz que habita em seus lábios
levavam você pro Iraque, levavam você pra Israel

mas não vá para longe enquanto ainda há noite
fique aqui comigo, tenha pressa não...

agora clareou, por ora clareou
se soubessem a paz que habita em seus lábios
levavam você pra Rocinha, levavam você pro Borel

mas não vá para longe enquanto ainda há noite
fique aqui comigo, tenha pressa não...

domingo, junho 17

Viva!

Minha poesia não quer crítica
(não quer ser crítica!)
não quer lirismos nulos
não quer aplausos
não quer caderno B
não pretende ser cult
nem hype, nem soft
não quer demências
não quer ser blasê.
Minha poesia não quer rimar
(e rima!)
tem pernas próprias, caminha...
tem vida vivida ao relento, suor
conhaques, sorrisos, leituras, loucuras.
Minha poesia não quer assinar
primeiras páginas
não quer tecer paixonites vãs
não quer visitar Paris
prefere a Lapa, minha poesia.
Minha poesia dispensa cerimônias
não frequenta saraus e seus geniais verseios gélidos
(enquanto os gênios não pensam na punhetinha ante-sono,
articulam bobagens com ar lord inglês).
Minha poesia quer cessar os mandamentos ray society
quer distinguir nuances e manchar aquarelas inteiras.
Minha poesia quer ser menino, moleque, livres pensamentos
feito brisa fresca entrando pela fresta entreaberta
feito mar azul visto ao descer uma estrada
feito amor revivido ao dobrar uma esquina
feito adeus sofrido no cais
(oscilações, cores distintas, tantos sentires...).
Minha poesia quer ser agora, quer ser presente
minha poesia só quer viver...

terça-feira, junho 5

sutilezas

carece de dizer o que deseja
e beija o travesseiro a cada noite
finge a felicidade marejada
em olhos que me ditam desorientação

não diga que me ama assim tão vã
arrume as suas coisas e venha para mim
a casa é sua e eu sou teu
sem dizer sim, sem cerimônias

não diga que me ama, não precisa
dizer não é comprovação
sutilezas me descrevem teus sentidos
em meus ouvidos tantas palavras soam

porque nem tudo é poesia
e porque nem todo verso fala de amor
mas a essência que nos une mostra-se clara
dispensa perguntas, dispensa palavras

sentidos calejados pelo tempo
no não-dizer que mostra-se indecifrável
querer-te me soa o mais natural dos sentidos
e então naturalmente os dias passam...

diz mais o euteamo das minúcias
e eu digo e desdigo em cada gesto
me diz também em cada traço, em cada passo
diálogos moldados de beleza
caminhos se entrelaçam sob estrelas
em nosso encontro reinará a sutileza...

domingo, maio 13

Pra Juliana cantar no carnaval

e não me importa mais agora
eu já não penso tanto assim também já passou da hora
para falar sobre o tempo das flores há de se ter ao menos minúcias de primavera
mas é inverno
mas é inverno
visto o meu capuz londrino e ando pelos caminhos mais inóspitos
que é onde você sempre está com a cabeça na lua
não vai à praia, não toma chuva, não dança nua durante o banho
não lê revistas, não fala gírias, não canta Chico e ainda me chama de estranho
você é música que não se toca
e eu me recuso a cantar para o mundo que esta sua estranheza arrebata-me inteiro
é que ninguém vai me entender mesmo...
é que ninguém vai me entender mesmo...
e não me importa mais agora
eu já não penso tanto assim também já passou da hora
para falar sobre o tempo das flores há de se ter ao menos minúcias de primavera
mas é inverno
mas é inverno
repousaremos nossos pensamentos em cálidas paisagens
enquanto sonhamos acordados embaixo deste cobertor de lã

segunda-feira, maio 7

O mar, o amar e o amargo

Ela parou pra ver o mar, eles andavam em silêncio, mal percebeu que os passos dela já não o acompanhavam, manhã nublada, praia vazia, ele a olhava de longe, vislumbrando as águas, tentando encontrar-se nas oscilações da vida, no rumo brusco em que o amor tomou, estava linda com aquela blusa larga e os cabelos assim desleixados, não entendiam aquele vão abissal que pairava entre eles, um vão que naquele momento mostrou-se palpável, visto plenamente nesta distância de 15 ou 20 passos que os separavam, ela parada frente às ondas, ele pensando no amor que sentia; uma ponte de sentimentos desconexos, as ondas batendo nas pedras, nuances de sonhos perdidos em passos deixados na areia, cada passo contando uma história, mas os caminhos nunca se encontravam, alguns passos eram mais contidos, alguns por demais ligeiros, mais leves, mais densos, não havia sintonia na história ali contada entre rastros e ondas. Distanciavam-se por puro instinto, não porque queriam, o destino traçara um outro rumo para ambos, a energia que pairara era disforme, sentidos tão presentes em cada alma que era dolorido até olhar nos olhos, triste demais ver um amor se desfazendo assim aos poucos, desmoronando os castelos tão sólidos, desviando a brisa suave que entrava pela fresta entreaberta, desconstruindo minúcias, arruinando sutilezas; a dor de quem perde um amor tão sublime provavelmente é a dor de quem perde um membro vital e a partir de então tem de aprender a viver de outra forma, readaptar-se à vida com uma cicatriz profunda vista nos olhos marejados, lidar com o "bom dia" que calou-se nas manhãs dói, não mais ligar e perguntar bobagens dói, escutar uma canção antiga que remete-se ao amor vivido dói, dormir sozinho e deixar a tv ligada para certificar-se de que ainda há vida ao redor dói muito; ambos doíam inteiramente naquele silêncio latente que os tomou, mal sentiam os próprios pés, mal sabiam-se quietos porque os pensamentos eram muitos, porque haviam lembranças tão vivas, porque palavras não-ditas ainda ressoavam em seus ouvidos; continuaram distantes, ela mais à frente, encontrando no mar os sentidos que já não tinha, ele a olhava com olhos pequeninos, de quem quer acalentar mas já não pode, deixou-se fluir junto ao barulho das ondas, se entregou à dor, até esquecer-se naquele instante, enquanto ela fitava o mar com o seu olhar perdido e choroso, ambos percebendo meticulosamente as sensações que os tomavam, ali ficaram por minutos, ou horas, este conceito de tempo é muito relativo quando se está prestes a perder o grande amor.

Entenderam que o amor terminaria ali, olharam a ponte abissal que os separavam, compreenderam que não havia mais motivo para atravessá-la, que lhes restavam a dor e as sensações que pairavam no tempo, sentiram o amor se esvaindo, e isso é como passar uma faca bem afiada em suas almas já tão desgastadas, as mãos trêmulas, um vazio amargando a boca, o amor virando areia, o amor caminhando com seus próprios pés, tomando cada vez mais distância, até desaparecer por entre as dunas.


Ele não percebeu quando ela se foi, ela não olhou pra trás quando decidiu ir embora; na verdade, ninguém sabe ao certo quem partiu primeiro.

segunda-feira, abril 30

cáminhadô

caminha dor
caminhador
andou, andou, se foi...
caminhou.

domingo, abril 22

ao céu azul do mar

olhe pro mar, amor
olhe pro céu
olhe pra mim como quem olha a si mesma
e se desencontre em todos os meus beijos
se perca em todos os sorrisos
pra não se perder na dor
olhe pro mar, amor
olhe para me avistar
mergulhe bem nos meus olhos
agora diga o que viu com os olhos fechados
ao mar e ao céu
ao mar ao mar ao céu
ao céu azul do mar
cantaremos melodias
e veremos este encanto acontecer
ao mar e ao céu
ao mar ao mar ao céu
ao céu azul do mar
olhando as estrelas caindo no mar
e o azul do céu escurecer...

(versos escritos na areia
deixando rastros deste amor no tempo
ondas batendo, cabelos ao vento
corpos sedentos por mar e prazer
seus olhos azulando a noite densa
agora tudo pode acontecer...)

segunda-feira, março 26

acessos

eu hoje revejo os seus versos
e me ponho a pensar em seus badulaques azuis-
cor de mar



somos jovens pra pensar no fim do mundo
foi você quem disse
somos o mundo quando transformarmo-nos em três
que logo depois serão quatro
- eu lhe disse



a chave está com o porteiro
entre sem fazer barulho
eu posso estar dormindo-
acordado buscando
os tons reais do
caminho lúdico
nos sons que
transcrevo


minha cara
no espelho
remete-me
ao tempo
em que
dançamos
descompassos
num dia
de chuva
e de frio


minha cara, minha cara, minha cara
sinta-se em casa...

regue as plantas, leia os jornais
pinte as unhas de vermelho-escarlate
prenda os cabelos, passe um café

ajeite os portas-retratos, ria da minha desordem
experimente usar o meu perfume
e faça um bolo de limão


quando sair
deixe um bilhete-
poesia
e guarde a imagem
dos meus sonhos
azuis
oscilando
entre canções
de amores
multi-coloridos



eu posso acordar de repente
querendo sonhar sonhos seus...

sexta-feira, março 23

dadá

bailavam cegas
andorinhas de inverno
vermelhas e cinzas
como o céu de outrora

e ainda que inertes
ao tempo e ao clima
bailavam bailavam
sorriam pra mim

mas não me viam
ou viam as cores
da alma que é minha?
ou não sorriam
tratava-se apenas do vão irreal
de minha mente já posta à venda?
ou era fuga do marasmo vivo
num riso de andorinhas vermelhas-vermelhas?
ou eram cinzas dos dias mais quentes
disformes no frio de um vôo só meu?

terça-feira, março 13

Carta para os novos dias

Eu não escrevo pra você, não perderia tempo articulando sensações tão grandiosas direcionadas a alguém tão pequeno e superficial.Escrevo por instinto, escrevo já apagando todas as lembranças nestas linhas, escrevo para não lembrar, para não querer, para não pensar em nada além dessas palavras.Então escrevo, e escrever assim, tão despretenciosamente, é como mover-me para uma outra esfera, onde os ares são mais leves, onde a brisa é afago, e o mar é poesia.Ali é o meu mundo, o mundo em que escrevo tem seus próprios tons, o mundo em que escrevo não é o seu mundo, certamente.Por isso escrevo intensamente por todos esses dias, para não viver em seu mundo, para não caminhar em seu mundo, para não perceber o seu mundo.Pois o seu mundo é cinza, o seu mundo é nublado, é vago, é triste, amargurado e complexo.Não, não quero mais viver assim.Não posso.Não quero aprofundar-me neste vazio repleto de sensações obscuras.Não posso mais render-me a estes dias de moletons e filminhos dramáticos, não posso achar poética esta sua maneira de viver, sempre em busca, sempre insatisfeito.Chega!
Por hoje quero apenas este dia ensolarado, por hoje quero esta tarde, quero este mar, quero a canção bonita da Gal, quero o poema florido de Alice, quero caminhar no Arpoador, quero brindar o crepúsculo e voltar pra casa sem pressa, percebendo as pessoas, enxergando as munuciosidades que, ao seu lado, eu jamais perceberia.
Por hoje, eu já não te quero.
Por hoje eu decidi me querer.
Por hoje olharei no espelho e direi "Eu te amo!".
Por hoje escrevo para não pensar em você, para não viver em você, para não escrever pra você.
Hoje, suavemente, já percebo com clareza o quanto é essencial, sublime e renovador, deixar as lamúrias num canto, respirar fundo, e tirar uns dias apenas para se amar intensamente.
E eis que, de repente, as brisas são afagos, os ares são mais leves, o céu tem seus próprios tons, e nossa...o mar é poesia.

domingo, março 4

de nada

meu poema não é pra você
não há poesia em sua boca
não há poesia em seu beijo
não há poesia em seu seio
não há poesia em você
não há poesia em mim
não há poesia no amor que vivemos
não há poesia
nessa poesia
então eu fico por aqui
sem poema, sem poesia
sem dilema, sem alegria
sem teoremas, sem teorias
sem dores, nem choros
nada de gritos, nada de esporros
tudo pra chegar ao nada
meu poema é sobre nada
e é tudo o que posso dizer
meu poema não fala de amor
meu poema não é pra você
sinto dizer,
mas não é.

domingo, fevereiro 4

Leve

um surto de loucura se instala
na sala um trem invade minha televisão
espasmos de memórias
histórias
bruxas e fadas vindo pela contramão

susurros e gemidos
vozes em meu ouvido me chamam pra sair
lá fora chove, é madrugada
asfalto molhado
passos rumo ao tudo e ao nada

poemas deixados num canto
encantos milenares bailam ao meu redor
olhares atentos de deusas e putas
conhaques, berros, fodas
corpo enxarcado de chuva e suor

sementes não mentem
há vida lá fora
há vida aqui dentro e um bocado de sangue
estanque este amor, minha maior loucura
mas deixe a minha vida intacta...socorro!
se o amor morrer eu morro
se o amor morrer eu morro

e eu quero esta dança
insanidade e caos me deixam tão leve
e eu quero dançar, eu quero esta dança
mesmo que seja breve, mesmo que seja breve

domingo, janeiro 28

Sereia Urbana

Gritos num dilúvio
de suores, de suores
murmúrios, os melhores
desde sua adolescência

Era morena
seus seios cabiam nas mãos
pequenos, redondos
profundos, os melhores
repletos de malemolências

Dançava pra ele
despia-se feito uma sereia urbana
falava de conhaque e de umbanda
pedia grana, queria jóias
Jóia rara a morena-sereia

Se encontravam na Lapa
noites quentes, noites quentes
num quarto abafado, no fundo de um beco
amavam-se com fome de amor
ele mais que ela, mas isso já não importava
ele a amava

Conforme passaram-se os dias
monotonia tomou conta da sereia
[urbana
já não queria carro, já não queria grana
pensava em samba, em boêmia
ele a queria, ela se foi

Nas noites insanas
a procurava pelos bondes
pelos bares, pelos becos
em todos os lugares
Morena-Sereia de seios redondos
partiu, não deixou carta, nem beijos, nem planos

Enlouqueceu de amor por ela
amava a sereia com todo o clamor
nas pedras do Arpoador, jogou-se no mar
e quis nadar com a sereia
brincadeira louca
morte mais insana
a sereia sambava e sorria no asfalto
era uma sereia-urbana

sábado, janeiro 20

reflexões em dó maior

( ... )
Mas antes de sair por esta porta, como quem vai em busca dos sonhos perdidos ou do paraíso encantado dos romances ingleses, me olhe nos olhos por alguns instantes, perceba o meu corpo ainda em total desalinho causado pela sua falta, me olhe com comoção devida, não banalize um apaixonado, mescle uma frieza e um calor necessários para tal olhar, há de se ter um certo equilíbrio, até porque olhares falam, e tudo o que você precisa é ficar em silêncio neste instante. Tenha bom-senso, ao menos por essa vez.Deixe-me te olhar atentamente por um tempo, perceber o que há em você de tão arrebatador que me fez querer viver a sua vida, me fez querer esquecer os meus passos e trilhar os caminhos que eram só seus.Sonhar os seus sonhos, doer em suas dores.Não precisa dizer nada, volto a dizer. Verdadeiramente não faço questão alguma de escutar qualquer pensamento seu.Deixe que este silêncio, este crucial silêncio, que pairou sob todo o tempo em que estivemos juntos, se instale neste momento.É um momento importante, o tão esperado momento, o momento da vã despedida, você sonhou com isso, tenho certeza.Deve ter ensaiado diálogos em frente ao espelho, testado esta ou aquela fisionomia, você gosta dessas coisas, sempre gostou.E não vamos terminar com berros, não vamos terminar com taças lançadas contra a parede, com culpas, com ódios vãos.Não, morre-se o amor mas fica-se a elegância, que neste momento não serve pra porra nenhuma, mas foda-se, optei por ser elegante nesta tortuosa despedida, não tentarei te impedir, não farei cena, me comportarei feito um Lord.Eu só posso terminar este emaranhado de sensações tempestuosas com este silêncio que se instalou no momento crucial, o da triste, solitária e apática despedida.Um silêncio sufocante, assustador, delirante.Um silêncio tão terrivelmente louco, que me pôs em choque, anestesiado, e você me olhando sem saber se devia olhar pra mim, ou pros lados, ou fechar os olhos; até neste momento você foi um babaca, juro...tive vontade de rir da sua cara.Eu não poderia esperar nada de um amor tão difuso, ambíguo, imaturo e canalha.Seu sorriso agora só me traz tristeza.Tuas palavras doces amargaram o meu dia.Termino esta história com o mesmo silêncio que pairou sob a despedida, e antes ainda, sob todo o tempo em que ficamos juntos.Tempo de silêncios, de palavras vazias, de discursos frígidos.Paira por aqui este infindável silêncio, silêncio esse, que deve ter sido o discurso mais romântico, e verdadeiro, que você me ofereceu.