quarta-feira, julho 25

impulso

inclino o meu corpo em direção a seus olhos, sedentos por uma vodka e um cigarro, reclamando do calor e do trânsito e da vida e da demora de tudo; inclino ainda mais o meu corpo, enquanto articulas sobre as notícias e o trabalho e o aluguel absurdo e o preço da gasolina; inclino o meu corpo em extensa demasia, enquanto comentas o filme em cartaz, o livro que lera, as piruetas do seu cão, a canção da novela; inclino intensamente o meu corpo, você indaga-se a respeito da política, da meteorologia, da gastronomia, da filosofia, dos seus dissabores; inclino plenamente o meu corpo num só impulso em direção a seus olhos, e desabo cruamente no chão.Você percebe-me inteiro, palpável, acessível, vulnerável; retraio com destreza o meu corpo acanhado, para que já não me vejas...

terça-feira, julho 24

sem mapa

onde as brisas serão rosas cálidas
enlaçando-se ao meu desalinho
ventanias submersas no tempo
reluzindo o presságio dos mares

e após o vislumbre das ondas
me dizes que vais me esperar
às 02:15 no antigo cais
direi-te adeus com meus olhos de céu
navegante das águas bravias

no oceano sem mapa em que partes
choverá por todo o gélido inverno
e as águas do céu serão tuas
beberás cada gota de mim

terça-feira, julho 17

Sobre sutilezas e introspecções

Difícil à beça falar de economia Lulística enquanto se esta louco de paixão, com o coração aos descompassos, a boca seca e o celular te olhando com um certo ar de desdém; chego a pensar que ele está com defeito, e desligo e ligo imediatamente o aparelho, para ver se assim ele chama e eu atendo e é você do outro lado convidando pra um pizza, onde falaremos de qualquer assunto, só para estar perto um do outro, poder olhar de perto cada dente mais à mostra, cada minúcia dos lábios, os gestos tão soltos, cabelos despenteados entre chopps e mordidas.Tão bom estar assim, perto, acessível, sem buscas vãs, sem discussões profundas sobre o mundo, só a gente ali naquele bar quase cheio, mas ainda assim só a gente naquele lugar, lembrando de um dia qualquer de um tempo sem importância, enquanto você abre a bolsa e pega um batom e eu o tomo suavemente de suas mãos citando Caymmi, “não pinte esse rosto que eu gosto, que eu gosto, é que é só meu...”, você sorri tão feliz que a essa altura eu já ganhei a noite, e fico extremamente contente só em te ver sorrindo assim pra mim, sem cerimônias, sem receios.Você é livre e isso me encanta tanto, tenho vontade de ficar te olhando por um tempo, só te olhando, percebendo as tais particularidades tão suas, os teus gestos mais afoitos, o seu jeito de olhar para as coisas, e sabe o que eu gosto mais ainda?Quando você suspira pra falar, então articula sem rodeios, e logo em seguida pergunta se falou demais, eu acho tão bonito, você falando e falando e eu, no mais profundo ardor da paixão, me desligando de todos os sons e fitando somente a sua imagem encantada à minha frente, pintura em movimento, e de repente o som cessa de uma só vez e você indaga tão sutilmente se excedeu-se em seus pensamentos; tão linda, tão perto, tão minha, me aproximo e te abraço com todos os suspiros e desejos, me aninhando em seu pescoço como quem tem sede de amor e digo que ‘não’, que é sempre maravilhoso escutá-la, que realmente este filme do Almodóvar é um primor artístico, e logo emendo falando do novo disco do Caetano e você escuta tão atentamente que eu me pergunto se estou falando sozinho, enquanto você adentra em cada sutileza minha, deixo-me levar por todo aquele encanto e continuo articulando pensamentos e citando versos e olhando fixamente em seus olhos e te amando em cada detalhe de seu rosto e te desejando em cada frescor de sua voz e me apaixonando cada vez mais em cada instante ainda mais profundamente e porra...nada do telefone tocar!


- Sabe, Clóvis, li num artigo um pensamento instigante, dizendo que "a condução da política de juros - os maiores do mundo - pelo governo é desastrosa porque dinheiro que deveria ser investido em obras públicas de grande impacto econômico é totalmente drenado ao setor financeiro..."

- Aham...sei...interessante...

segunda-feira, julho 16

a busca

garagens
instantes
estantes
e tratores
estacionam
em direção
ao sentido
em direção
ao sentido sim tido?
ou ao sentido sentido?
será-sarah-serão-sarau-será que chegarão?
senão este poema
será o quê,
então?
sentido sem tido
é apenas sen
garagens
instantes
estantes
e tratores
estacionam
em direção ao
tido.

ao volante da vida
o poeta brinca de palavras-
encruzilhadas.

terça-feira, julho 3

Trilha Sonora pra Juliana

numa poça d'água que restara
de uma tempestade repentina
ela afunda suas meias-beges
para esfriar a cabeça e se esquenta
rumo à Arábia Saudita
porque quer provar sushis exóticos

ganha as horas contando estrelas-do-mar
e dançando Ronnie Von em frente ao espelho
suspeita até não pertecer à este mundo
mas ela morre de medo de Et's e nunca nunca
nunca andou num disco-voador

dirigindo o seu escort verde-uva ela fita a orla de Ipanema
ela escuta rock and roll, ajeita os cabelos, e pensa em mim...