terça-feira, outubro 9

Caminhador

Habito, sobretudo, em papéis.Às vezes, de súbito, desprendo-me de folhas e vagueio por aí, descompassado, escrevendo em postes, em luzes, em carros com seus autofalantes, nas calçadas sujas, na mulher rude fumando o seu Marlboro, no cão que late ao léu, sem dono; no silêncio, no escuro da noite, na cintilância dos breus.Escrevo em ruas, escrevo em passos.Caminha dor...
Mas logo volto aos papéis, desarrumados, repletos de auroras, e por ali adormeço, inteiro e lépido. É que sempre vivi amor em palavras, me apaixonei por versos, por metáforas, citações, poesias.
É que sempre lidei melhor com palavras, com a naturalidade de quem molda um artefato pleno, cristalino, minucioso; quanto aos humanos, encontram-se normais em demasia - buscando água salgada em cachoeiras, almejando outros planetas, quiçá todo o universo e esquecendo, por completo, que há um mundo, cá dentro, esquecido, ainda não desbravado em sua verdadeira infinitude e importância - , tornam-se, portanto, tão mais complexos, tão mais difusos, tão mais distantes do que há de próximo em cada Ser, estar Sendo, Viver...
Eu sou dentro.

7 comentários:

Alexandre Beanes disse...

isso é mesmo um troço com a sua cara. com uma leveza tão profunda que de tão, dói e alegra...sabe-se lá como.
aí dentro é mesmo muito bonito, meu caro.

Carolina Lomba disse...

Me emocionei. Também quero buscar a água salgada nas cachoeiras. Estou dentro. Cá dentro. Silêncio. Quero escutar o universo difuso, o universo distante.

Sabe Clóvis, às vezes tem o medo de pular e descobrir o que tinha dentro. As vezes faltou a coragem de dizer que sim, amava. Clóvis e se o poço for escuro. E se não tiver como voltar? Como é que se faz para capricorniana pular no poço?

Bebo então da água salgada da sua cachoeira. Instante efêmero junto ao poço.

Obrigado.

Carolina Lomba disse...

Bom, voltei!

Voltei para dizer que vc me inspirou. Essa cachoeira de água salgada mecheu comigo.

Passa no meu blog, que vc confere.

abraços!!!

Priscila Lopes disse...

Muito bom, muito bom, muito bom, muito bom, muito bom...

Escrevo a respeito de uma novidade literária: é o blog CINCO ESPINHOS, criado por mim e pela amiga Aline Gallina, com o intuito de fazer crítica literária em forma de literatura (poesia, crônicas, contos ou pensamentos).

http://cincoespinhos.blogspot.com

ALÉM DISSO, TODA SEMANA ESTAREMOS PUBLICANDO UM TEXTO DE UM AUTOR "DESCONHECIDO", POR NÓS GARIMPADO NA INTERNET, NA INTENÇÃO DE REVELARMOS ESCRITORES CONTEMPORÂNEOS QUE VALHAM A PENA.

Obrigada pela atenção. Comente. Participe!

Abraços

Camila Lemos disse...

Você é lindo,isso sim,homem!:)

Feliz são os que habitam seus interiores,nêgo.

Coisa linda demais isso aqui!

Xêro!

Samantha Abreu disse...

putz.
Esse texto ficou lindo.

"É que sempre lidei melhor com palavras, com a naturalidade de quem molda um artefato pleno, cristalino, minucioso; quanto aos humanos, encontram-se normais em demasia..."

Acho que nem Dona Clarice teria escrito esse trecho melhor.
Realmente, dói. E é gostoso.

Um beijo!

Anônimo disse...

Deixei-me levar,,, e fui até um lugar onde as coisas estão confusas,,, mutação da humanidade...

Por agora quem está dentro não tem muita direção... Eu sou dentro...

Abraços e reflexivas invenções!